quarta-feira, 24 de dezembro de 2008

SE É POR FALTA DE ADEUS...

A Nana tá cantando o adeus que se adia, num bolero. Adiou o meu, deve ter se adiado o dela e o de alguém que pra Dolores também compôs. Ela canta vários adeuses, afirmando que é espontâneo o adeus seriado, que não se faz numa tomada. Despedidas aos poucos, é pouca, pra poucos.

Mais uma vez as coisas abanam as mãos do lado de lá e eu sacudo as minhas do lado de cá. - Alô, senhor de Neruda, eu agora tenho um cabelo de tampão-da-mesa-de madeira-de-lei-da-minha-própria-casa-há-alguns-anos pra combinar com o dias furta-cor. A Loreal prova por tom sobre tom que nada dura tanto quanto as frutas da estação.

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

VESTI O CABELO DE DIONNE WARWICK

Oblíqua e dissimulada ao lado de Marlon Brando, num verão de 1951. Obs. venta pouco no vilarejo e Blanche dispõe de poucos sabonetes. É o que se passa nessa tela enquanto espera telefonemas, adíos, boas vindas e até mais. As coisas duram menos que um sabonete no formato protex.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

TECLA SAPE

É que não sei ver o verdinho das gramas, as figuras propositais em tantos céus, saber que o sol sorri, que o amor canta em sinos e que tanta breguice tem alvará para ser um porre. Quando vou enxergar o sol radiante, a luz dos seus olhos ou qualquer outro clichê de amor e dor, passam a frente, como cheerleaders, unicórnios, gauguins mancos, lavagem para os porcos que peidam e seus modelos punks. No mais, não sei desenhar e não gosto de cor-de rosa e pelúcia.

quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

CONTANDO NOS DEDOS

Daqui a três meses, durante 45 dias, só depois de seis meses, válido por dois anos, depois do dia 25, são vinte e quatro parcelas, mais dez sessões. Tem alguém olhando e achando graça do esplendor da dor.

- o homem com uma dor é muito mais elegante/caminha assim de lado/ como se chegando atrasado andasse mais adiante - leminski disse, itamar repete.

O Du ligou. Voltava pra casa caminhando. Lembrou do pão. Pedimos das nossas famílias. O presente da Duda continua embrulhado. Mandamos lembranças a eles. Combinamos o café no meio da tarde. É o mesmo papo da semana antes deste carnaval. A última vez que te vi, Du, você usava a camisa do Brasil num domingo bem de tarde, a Duda ainda não era da família. André, Douglas, Dani, Luísa e Kauã. Onde você estava em junho de 2006? Existem domingos com jeito de terça, aquele era. Esse tem aura de macarrão com tubaína e bolas azuis de tristeza.

Em caso de dor ponha gelo
Mude o corte de cabelo
Mude como modelo
Vá ao cinema dê um sorriso
Ainda que amarelo, esqueça seu cotovelo
Se amargo foi já ter sido
Troque já esse vestido
Troque o padrão do tecido
Saia do sério deixe os critérios
Siga todos os sentidos
Faça fazer sentido
A cada mil lágrimas sai um milagre
Em caso de tristeza vire a mesa
Coma só a sobremesa, coma somente a cereja
Jogue para cima, faça cena
Cante as rimas de um poema
Sofra penas, viva apenas
Sendo só fissura ou loucura
Quem sabe casando cura
Ninguém sabe o que procura
Faça uma novena reze um terço
Caia fora do contexto invente seu endereço
A cada mil lágrimas sai um milagre
Mas se apesar de banal
Chorar for inevitável
Sinta o gosto do sal do sal do sal
Sinta o gosto do sal
Gota a gota, uma a uma
Duas, três, dez, cem mil lágrimas sinta o milagre
A cada mil lágrimas sai um milagre

(itamar)

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

VOLVER A LOS 17 AÑOS

Curo insônia, náuseas, cãibra, gases, fatalidades e amenidades, entre outras dejetos, com uma colherada de cor púrpura e figurinos de almodóvar.

Da série: Coisas que pararam de doer agora há pouco para outras começar a usar band-aid.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

FILA DO REPETECO

Domingo, 4 de Maio de 2008

MALWEE, NÚMERO 16, USAR SABÃO NEUTRO
O cão tá parecendo um sem dono, dormindo com a fuça dentro de um Luiz XV mofado, resgatado ainda há pouco do armário. Ele encontrou o vão entre a roda da cadeira e o sapato jogado no canto e se acomodou. Ele só dorme no vão e com a fuça também acomodada.

É o segundo dia da trinca: meia, moleton usado desde 97 e creme para as mãos. Não vejo muitas perspectivas num dia como este.Em dias assim, não enxergo nada adiante. É o fim da minha vida em dias como esse. É como o último capítulo do livro que sei que não terei mais tempo de ler nessa vida, o último dia da festa que começou na quinta-feira, a despedida na casa dos tios, em janeiro de 91.

Em dias assim, eu morro sem dor. Não sirvo para muita coisa. Não sei tossir, não sei chorar. Não sei retribuir sorrisos. Não abano a mão na rua. Não espero pelo que sei que vem. Não acho bonita as broas de milho. Nem gizes de cera comestíveis me trariam qualquer boa notícia. Menos ainda incenso para uso individual, a criação que espero há séculos.

Sou morta em dias como esse. É assim desde que eu passava as tardes com Adora, Simoninha e Pepita. Quero ficar morta hoje. Enquanto esse inverno garoante não passar, com noites caindo ainda às seis, continuarei morrendo nesses dias.

Eu quero uma coisa que ninguém é capaz de me dar. Ninguém nem pode saber o que eu quero. Eu quero coisas que queria desde o tempo que conversava com Adora, Simoninha e Pepita.Eu nunca pedi bonecas duradouras, meus sonhos sempre foram os mesmos.

Eu troco algumas coisas por essa coisa que quero tanto. Eu leiloo certas coisas por essa coisa que quero agora. Ordenes e farei, pois hoje estou morta aqui. Tem uma coisa doendo. Tem uma coisa lembrando de outra que aconteceu. A capa do livro, nenhuma música e três mudas de roupa de cada um para lembrar e nenhuma confidência desesperada de quem age com paixão pela última vez.

Você é capaz de adivinhar? Eu não sou capaz de falar o que eu estou querendo. Já fui capaz de escrever cartas ao nove e dizer que queria ainda ontem, mas hoje não tenho coragem. Pode ser que eu queira menos daqui a duas semanas, pode ser que eu fique doente porque quero muito mais, pode ser.

Hoje quero ter cólica, tomar morfina e acordar amanhã às sete com febre. Hoje meu suicídio é com arco e flecha. Eu quero uma coisa que duas pessoas têm.

Lembrava de já ter tido um dia assim, com pouca ou nenhuma perspectiva e um pacote até a boca de tédio. Era um verão do ano seguinte ao que mestruara pela primeira vez. Deitada de bruço no alto de um escorregador, de um parquinho parecendo a casa dos três porquinhos que o lobo bobo assoprou pela segunda vez, ela pensava se nos próximos dez anos teria um outro dia assim, chinfrim.

Pensou em Collor, se a vida dela seria mais engraçada do que a dele. Se poderia ter a vida que ele tinha, pensou em um monte de coisas, pensou. Mas pensou principalmente no Collor e naquela faixa verde e amarela com uma dália na ponta, que ele usava na posse ou no sete de setembro.

Em um dia como este, há muito tempo, ela viu um dos filmes que mais gostava pela segunda vez, mas era um sábado e não uma quinta. Há muitas quintas, ocorridas dois anos atrás, ela mantinha encontros frenéticos, alimentava paixões capengas, encarava sem adeus as despedidas e nunca tinha dito que gostava. Por causa disso, somatizou ansiedade na boca do estômago e sempre vomitava nas sarjetas, antes de ir pro abate.

Perdi um dia, não vi a cara da rua. Quando fizer o saldo dos anos, revendo um calendário que ficou ali por acaso, não terei nada para contar sobre esse dia. Nenhuma violência cometida contra mim, nenhuma conferida no holerite do mês passado, nenhuma coisa que valesse para os dias seguintes desta vida...

Não me arrisco em dias assim. Uso poucas palavras: tudo bem e tanto faz. Cheguei a sair de casa nesse dia tão assim. Foi pra comprar meias vermelhas de algodão com fim terapêuticos, eu que inventei essa calmaria. Cruzei também a porta da frente para saber onde irei plantar as sementes de coentro que descolei com um vizinho.

Hoje é o último dia na vida de um quinzilhão de pessoas e elas só serão avisadas mais tarde. Neste momento, elas estão apenas preocupadas com a roupa que não seca no varal, com o motor do carro e se vão casar. No dia que era pra ser o último dia da minha vida, eu fiz bolo de limão e lamentei pelas coisas dos outros.

Amanhã vou saber se sou uma dessas. Mas já sou uma delas hoje...

terça-feira, 2 de dezembro de 2008

DE CÁ O WHISKY, COWBOY

Nem deu tempo de Chinaski chegar com suas recomendações. Já havia confiado meus dias pouco tônicos a outro companheiro que no futuro ganhou um concurso anual de sósias. Tudo aquilo que pode ser disputado num cuspe a distância, ê velho maneco, serve para poesia, para receituário de aspirina e para atravessar um gargalo depois de doze anos contado às pressas.

Da série: Coisas que começaram a doer agora há pouco.