domingo, 27 de setembro de 2009

CATALOGAÇÃO

ele está na sala debruçado sobre a mesa escrevendo amenidades sobre mim com letras bem miudinhas. vez ou outra rabisca e começa de novo. é a tentativa de adeus mais orquestrada dessa última temporada. ele pede o papel, diz que tem a caneta e dá a entender que o bilhete é pra mim.

*

ele está deitado no chão, ouvindo the mamas & the papas e correndo os olhos sobre mim. dali a pouco vai dizer que não tem mais saco pra um monte de coisa, que esse seu tempo já passou. mas ela entende o que quer entender e diz que também se arriscou. cada um diz mais duas ou três coisas. depois de uma, duas ou quatro semanas ela dá adeus enquanto atravessa o corredor, para o adeus que ele tinha dito naquela noite de sexo tão solene.

*

ele está com os olhos rasos e um poema na cabeça. ela está com uma rave no estômago, com o livro do poema e zonza. ela diz: vou, ele observa. depois ela vai e o dia fica parado o dia todo às 9 em ponto da manhã.

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ele está com roupa de gala e não me reconhece muito bem. ela está com roupa de gala e pede pra que ele comece. então ele diz adeus pelos dois. e o fim que chegou há um mês, chega de novo.

*

ele não veio se despedir. aliás, nunca se despede, nem quando vai embora. encosta os lábios no que tiver ao alcance e não se sabe se ele vai ali pegar o isqueiro ou se vai passar a luz de mel há 3000 km dali. então volta e meia eu me despeço por conta, para nunca mais ou até amanhã.


*

o tal do infinito enquanto dure.

PORTA DA GELADEIRA

Quando eu os amarei?
De minha parte, eu não sei.
Pode ser nunca. Pode ser amanhã.

(Carmen, de Bizet)